19/07/2012

Política e Você.

SAIBA POR QUE ELA SEMPRE FAZ PARTE DA SUA VIDA, MESMO QUE VOCÊ NÃO QUEIRA, E DESCUBRA COMO ATUAR NO LOCAL ONDE VIVE - SEM PRECISAR SE ENVOLVER COM PARTIDOS OU PROGRAMAS ELEITORAIS

Corrupção, escândalos, falta de representatividade. Não é à toa que as pessoas se sentem afastadas da política. Segundo urna pesquisa encomendada pelo Senado Federal em 2011, apenas dois em cada dez brasileiros declaram ter um inte­resse 'alto' pelo tema. Mas a verdade é que não é só em Brasília que mora a política, Nem só nos partidos, elei­ções e programas eleitorais. Com elei­ções municipais se aproximando, em outubro, é bom lembrar que esse po­der é e deveria ser de todos nós.
Reciclar o lixo, parar na faixa de pedestres, dar bom dia ao vizinho: es­sas são todas atitudes políticas. Elas podem não envolver leis e disputas partidárias, mas toda vez que toma­mos atitudes envolvendo a vida de
outras pessoas próximas a nós, ou em nossa comunidade, estamos tomando uma posição política, Até quem diz odiar e não ligar para o assunto está tendo uma atitude política. "A política está no dia a dia, porque ela está na co­munidade", diz Mano Sérgio Cortella, filósofo e professor da PUC-SP e au­tor de Política para Não Ser um Idiota (editora 7 Mares). :fSeja ela um pré­dio, um bairro, uma cidade, uma na­ção, um planeta", afirma.
Filósofos e cientistas sociais pen­sam há séculos no significado da polí­tica, que já foi considerada a mais no­bre das atividades humanas. Para en­tender a raiz dessa atividade, tão de­sacreditada hoje, é preciso perceber que ela é muito mais que o jogo polí­tico oficial. Renato Janine Ribeiro, filósofo e pesquisador, resume em um trecho do livro Política Paru Não Ser Um Idiota: "Política é o mundo feio, em que os políticos mandam. Não te­mos muito a ver com eles." Pois é aí que está o engano.

UM PRIVILÉGIO
Um dos maiores pensadores gregos, o filósofo Aristóteles, declarou: "O ho­mem é por natureza um animal po­lítico". Ela estaria tão entranhada em nossas vidas que seria (ou deveria ser) parte do que nos define como se­res humanos. Os gregos foram alguns dos mais fervorosos defensores dessa arte. Para eies, a vida em comunidade era um valor admirável e participar das decisões da cidade era visto como um privilégio dado pelos deuses.
Em Atenas, a política estava aberta a todos que dispusessem de tempo para se dedicar aos debates e vota­ções. Era impossível pensar na vida sem política e ela se realizava na vida cotidiana. Aristóteles foi ainda mais longe, e afirmou que a finalidade da política é trazer a felicidade.
Claro, os tempos mudaram. Nossas comunidades são muito maiores que a Atenas daquela época, e até o conceito de felicidade mudou. Hoje milhões de pessoas vivem sob um mesmo go­verno e seria impossível que cada cida­dão participasse da discussão de cada aspecto da administração de uma ci­dade, estado e pais. Por isso, elegemos representantes, os políticos. Eles assu­mem o papel de argumentar e de con­duzir a confecção das leis.

DEMOCRACIA E FUTEBOL
E é aí que a coisa emperra, pois nos sentimos desanimados com um sis­tema político corrupto e que não re­presenta os interesses dos cidadãos. Mas, por mais que fiquemos indig­nados com o que fazem nossos repre­sentantes e tomemos a decisão de não acompanhar mais as notícias, con­tinuamos a viver e a respirar a polí­tica. "Nesse sentido, nenhum de nós
escapa da ação, reação e interação po­lítica, mesmo que não deseje", afirma Mário Sérgio Cortella.
Não foram poucas as vezes em que mudanças foram construídas pela própria sociedade para só depois serem incorporadas às instituições. Para Luiz Felipe DÃvila, diretor do Centro de Liderança Pública (CLP), o poder informal tem enormes vanta­gens que, muitas vezes, as pessoas su­bestimam. Revoluções incríveis ocor­reram a partir de pessoas que não ti­nham nenhum cargo importante, por exemplo. "Mahatma Gandhi conse­guiu fazer o movimento de indepen­dência da índia sem ter um cargo formal durante toda sua campanha de mobilização. Martin Luther King conseguiu mobilizar todos os Estados Unidos em torno dos direitos civis dos negros também sem ter uma po­sição oficial" diz ele. O poder de mo­bilizar as pessoas em torno de propó­sitos claros e projetos é enorme.
Um exemplo curioso e brasileiro aconteceu nos anos 1980.0 país vivia o fim da ditadura militar, mas ainda sem perspectiva de fazer eleições presiden­ciais diretas. Começava uma mobiliza­ção chamada Diretas Já, que envolveu muitas pessoas dentro e fora da política
tradicional. Entre elas, um time de fu­tebol, o Corinthians. Para dar o exem­plo, a direção deu a liberdade de os jo­gadores tomarem as decisões do time por voto direto. Tudo era colocado em debate e votação, "até se o ônibus ia pa­rar para alguém fazer xixi" contou o jo­gador Sócrales no livro batizado com o nome do movimento; Democracia Corinthiana (editora Boitempo). Para Wladímir Rodrigues dos Santos, 58, ex-lateral e um dos destaques da "Democracia", aquilo "foi uma opor­tunidade de mostrar às pessoas a im­portância de interferir na sua micror-região, microssociedade, uma situação em que os atletas de futebol pensavam não só na sua situação pessoal, mas no coletivo". O alcance da política atinge os mais distintos locais de convivência humana, em qualquer área.

DESTINO CONJUNTO
O que fazer, então, para não fugir da raia e cumprir a missão humana da convivência? Primeiro, é preciso pen­sar que a política é algo dentro do nosso alcance. Lui/, Felipe D'Ávila dá a pista do primeiro passo: "A política não é coisa de cientista político, ela é coisa das pessoas. Coisa do povo", diz. "Não é gente que fica pensando tese.
Se você não transformar essa tese em ação, ela não existe. Política é ação. O animal político do Aristóteles é isso." Não adianta só esperar acontecer, como diz a música. Vale lembrar que não existe política individual; existe ação individual na ação política. "Como diz o clássico poema do John Donne, nenhum homem é uma ilha, portanto, a política é o fato de que nós em arquipélago vivemos." Outras su­gestões para atuar politicamente você confere no quadro ao lado.
Na última parte de Política para Não Ser um Idiota, Cortella e Renato Janine Ribeiro discutem a necessidade da política em um mundo que luta contra a destruição que a própria hu­manidade vem causando à natureza. Na penúltima página, Ribeiro define o quanto ainda precisamos viver em comunidade e, portanto, dar valor à política: "Nossa sociedade pode ser muito individualista, mas nosso des­tino será jogado em conjunto". Melhor que nos afastarmos definitivamente da política para não termos de lidar com escândalos é retomarmossuãlT rédeas para de fato tentar melhorar as coisas. Esse é um exercício que fare­mos juntos, em comunidade. ©

MANUAL DE POLÍTICA 3.0
Torne-se uma pessoa muito mais atuante agora mesmo -sem precisar se envolver com partidos e programas eleitorais
  • Atue na sua comunidade: preocupe-se com a associação de bairro, o centro académico, a segurança do condomínio, o destino do lixo do prédio.
  • Faça algo pelo coletivo. Não precisa ser uma ação de solidariedade: vale organizar um coral, um clube de leitura ou um jogo de futebol semanal.
  • Informe-se. Para agir, é preciso saberoqueacontece. Nossa tendência é nos alienarmos, portanto, é preciso um esforço para acompanhar os fatos
  • e saber analisar, de forma independente, o que ocorre.
  • Não fuja da raia. "Quem está em comunidade e decide não participar acaba se tornando escravo da alienação em que se coloca", diz Cortella.
  • O mais importante è participar.
  • Atenção para as novas ferramentas. Por meio de sites e e-mails, é fácil se conectar com pessoas com interesses afins. Participe de um fórum sobre um tema que o interessa ou inicie uma lista de discussão no seu prédio.
  • Fiscalize. Também por meio da internet, dá para acompanhar o que fazem os políticos em quem você votou. Sites como webcitizen.com.br e votenaweb. com.br permitem acompanhar o andamento de projetos, por exemplo.

PARA SABER MAIS
  • Política para Não Ser um Idiota, de Mário Sérgio Cortella e Renato Janine Ribeiro, Editora 7 Mares.
  • Democracia Corinthiana, de Sócrates e Ricardo Gozzi, Editora Boitempo
  • Política, de Aristóteles, Editora Martins Fontes

A política está no dia a dia, porque ela está na comunidade”, diz o filósofo Mári Sergio Cortella

Conversar, organizar eventos, encontrar uma causa em comum: a política é feita quando as pessoas interagem.

Quando deixamos de lado as diferenças e conseguimos nos organizar, ficamos mais fortes e podemos fazer muito mais.

POR MAIS INDIGNADOS QUE FIQUEMOS COM A CORRUPÇÃO E A FALTA DE REPRESENTATIVIDADE, É IMPOSSÍVEL FUGIR DA POLÍTICA: ELA ESTÁ EM TODA PARTE

POLÍTICA TEM A VER COM AÇÃO: COMO DIZ A MÚSICA, NÃO ADIANTA ESPERAR ACONTECER. CADA UM É RESPONSÁVEL POR IR ATRÁS DE SOLUÇÕES

Fonte: texto de Diogo António Rodriguez publicado na revista Vida Simples de Julho 2012.

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