29/05/2015

Como é por dentro

Vamos fazer uma viagem do EU ao NÓS por meio do texto de Fernando Pessoa declamado por Antonio Abujamra.


Como é por dentro outra pessoa?
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo,
com que não há comunicação possível,
nem há verdadeiro entendimento.

Nada sabemos da alma,
senão da nossa.
As almas dos outros
são olhares,
são gestos,
são palavras,
supondo-se
qualquer semelhança no fundo.

Entendemo-nos porque nos ignoramos.
A vida que se vive
é um desentendimento fluido,
uma média alegre
entre a grandeza
que não há
e a felicidade
que não pode haver.

22/05/2015

Diante da lei...

Vamos fazer uma viagem do EU ao NÓS por meio do texto de Franz Kafka declamado por Antonio Abujamra:


A uma porta que dá para a lei
Diante dela um guardião
O guardião da porta da lei
Um homem simples chega
E pede para entrar
O guardião responde
Que naquele dia não é permitido entrar
O homem pensa um pouco
E pergunta
Quando poderei entrar
O guardião responde
Que de repente, mas não agora
Como a parta da lei está aberta
O Homem simples se agacha
Para olhar para dentro
Por entre as pernas do guardião
O guardião impede o homem de olhar
E o adverte
Adverte que lá dentro
Há outras portas
E outros guardiões
Um mais forte e feroz que os outros
O homem simples
Sempre pensara que a lei
Deveria se acessível a todos os homens
O guardião lhe empresta um banquinho
Para sentar-se a porta da lei
E ficar esperando a hora de entrar
Passam-se os dias e os anos
O homem simples
Continua perguntando
Quando poderá entrar
O guardião dá respostas vagas e impessoais
Dizendo sempre que a hora
De entrar ainda não chegou
O homem simples tira a roupa
Tira a roupa do corpo
E tenta subornar com ela
O guardião da porta da lei
O guardião não recusa
Aceito! Aceito!
Para que você não diga
Que não tentou tudo
Aceito!
Mas ainda não posso permitir
A sua entrada
Com o passar dos anos
O homem simples maldiz seu destino perverso
De dor, de sofrimento, em velhice
Sem poder cruzar a porta da lei
Que ali continua diante dele
Emanando uma claridade que ofusca
Seus olhos cansados
Nada lhe resta
Senão, a morte!
Agonizando, ocorre de perguntar
Ao guardião
Porque durante todos aqueles anos
Todos aqueles anos que esperou
Não apareceu nenhuma outra pessoa
Pedindo para entrar pela porta da lei
E o guardião responde
Ninguém quis entrar por esta porta
Por que ela se destina apenas a você
E agora, com sua morte

Eu terei de fecha-la... 

15/05/2015

Mas olhe para...

Vamos fazer uma viagem do EU ao Nós, por meio do texto Mas olhe para... de Clarice Lispector declamado pelo Antonio Abujamra.


Mas olhe para todos ao seu redor
e veja o que temos feito de nós
e a isso considerado vitória de cada dia.

Não temos amado,
acima de todas as coisas.
Não temos aceito o que não se entende
porque não queremos passar por tolos.

Temos amontoado coisas
e seguranças
por não nos termos
um ao outro.

Não temos nenhuma alegria
que já não tenha sido catalogada.
Temos construído catedrais,
e ficando do lado de fora
pois as catedrais que nós mesmos construímos,
tememos que sejam armadilhas.

Não nos temos entregue
a nós mesmos,
pois isso seria o começo de uma vida larga
e nós a tememos.

Temos evitado cair de joelhos
diante do primeiro de nós
que por amor diga: tens medo.

Temos organizado associações
e clubes sorridentes
onde se serve com ou sem soda.

Temos procurado nos salvar
mas sem usar a palavra salvação
para não nos envergonharmos de ser inocentes.

Não temos usado a palavra amor
para não termos de reconhecer
sua contextura de ódio,
de amor,
de ciúme
e de tantos outros contraditórios.

Temos mantido em segredo
a nossa morte
para tornar nossa vida possível.

Muitos de nós fazem arte
por não saber como é a outra coisa.

Temos disfarçado com falso amor
a nossa indiferença,
sabendo que nossa indiferença
é angústia disfarçada.

Temos disfarçado
com o pequeno medo
o grande medo maior
e por isso nunca
falamos no que realmente importa.
Falar no que realmente importa
é considerado uma gafe.

Não temos adorado
por termos a sensata mesquinhez
 de nos lembrarmos
a tempo dos falsos deuses.

Não temos sido puros
e ingênuos
 para não rirmos de nós mesmos
e para que no fim do dia
possamos dizer
“pelo menos não fui tolo”
e assim não ficarmos perplexos
antes de apagar a luz.

Temos sorrido em público
do que não sorriríamos
quando ficássemos sozinhos.

Temos chamado de fraqueza
a nossa candura.
Temo-nos temido
um ao outro,
acima de tudo.

E a tudo isso
consideramos
a vitória nossa de cada dia

08/05/2015

Para que a escrita seja


Vamos fazer uma viagem do EU ao NOS, por meio do texto Para que a escrita seja de Cecília Meireles, declamado por Antônio Abujamra.


Para que a escrita seja legível,
é preciso exercitar a mão
e conhecer todos os caracteres.

Mas para começar a dizer alguma coisa
que valha a pena,
é preciso conhecer
todos os sentidos desses caracteres
e ter experimentado em si próprio
todos esses sentidos.

E ter observado no mundo
e no transmundo
todos os resultados
do que se experimentou.

02/05/2015

Programa HPH

Começamos o programa “Humanos, perfeitamente humanos!” com a música Cio da terra (Renato Teixeira, Pena Branca e Xavantinho), com a PRESENÇA ESPECIAL de Ada do Porto Salvador.
No Bloco de Pais para Pais, com a minha mãe, conversamos sobre as diferenças nas relações de cuidados entre pais e filho, e filhos para pais. Quem não aprendeu a respeitar as pessoas da família como irão tratar as pessoas de fora. Nossa relação com a natureza justifica as situações de catástrofes. A terra é a mãe, precisa ser acarinhada e ter respeito. A natureza tem seu ciclo, devemos respeitar. Tratamos da gincana na Escola Padre Leopoldo sobre conhecimento de Valinhos. Temos a obrigação de fazermos o nosso melhor.
Encerramos o bloco celebramos a gratidão pela vida com a música Snowbird (Elvis Presley).     
ÚLTIMO BLOCO
Começamos o terceiro bloco do programa tocando a música Luardo sertão (Tonico e Tinoco).
VIAGEM DO “EU AO NÓS”
Encerramos o programa com o texto Vão parao diabo sem mim!, de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa, declamado por Antonio Abujamra.

Você tem uma segunda oportunidade para ouvir o Programa HPH, com sua reapresentação aos domingos das 15h00 as 16h00. Mas se quiser poderá ouvir o Programa HPH de hoje clicando aqui, ou assistir a Transmissão online (vídeo e áudio), clicando na 1ª Parte e 2ª Parte.

Depois de 17.637 dias de vida: Grato por este agora, um bom caminho e fique bem!

Até sábado que vem...

01/05/2015

Vão para...

Vamos fazer uma viagem do EU ao NÓS, por meio do texto Vão para o diabo sem mim!, de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa, declamado por Antônio Abujamra.


NÃO: Não quero nada. 
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!  
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!  
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!  Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas  
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) — 
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica. 
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo. 
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável? 
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa? 
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade. 
Assim, como sou, tenham paciência! 
Vão para o diabo sem mim, 
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo! 
Para que havemos de ir juntos?
Não me peguem no braço! 
Não gosto que me peguem no braço.  Quero ser sozinho.  
Já disse que sou sozinho! 
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!
Ó céu azul — o mesmo da minha infância — 
Eterna verdade vazia e perfeita!  
Ó macio Tejo ancestral e mudo, 
Pequena verdade onde o céu se reflete! 
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje! 
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz!  Não tardo, que eu nunca tardo... 
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!