SAIBA POR QUE ELA SEMPRE FAZ PARTE DA SUA VIDA, MESMO QUE VOCÊ NÃO QUEIRA, E DESCUBRA COMO ATUAR NO LOCAL ONDE VIVE - SEM PRECISAR SE ENVOLVER
COM PARTIDOS OU PROGRAMAS ELEITORAIS
Corrupção,
escândalos, falta de representatividade. Não é à toa que as pessoas se sentem
afastadas da política. Segundo urna pesquisa encomendada pelo Senado Federal em
2011, apenas dois em cada dez brasileiros declaram ter um interesse 'alto'
pelo tema. Mas a verdade é que não é só em Brasília que mora a política, Nem só
nos partidos, eleições e programas eleitorais. Com eleições municipais se
aproximando, em outubro, é bom lembrar que esse poder é e deveria ser de todos
nós.
Reciclar o lixo, parar na faixa de pedestres, dar bom dia ao vizinho: essas
são todas
atitudes políticas. Elas podem não envolver leis e disputas partidárias, mas
toda vez que tomamos atitudes envolvendo a vida de
outras pessoas próximas a nós, ou em nossa comunidade, estamos tomando uma posição política,
Até quem diz odiar e não ligar para o assunto está tendo uma atitude política.
"A política está no dia a dia, porque ela está na comunidade", diz
Mano Sérgio Cortella, filósofo e professor da PUC-SP e autor de Política
para Não Ser um Idiota (editora 7 Mares). :fSeja ela um prédio,
um bairro, uma cidade, uma nação, um planeta", afirma.
Filósofos e
cientistas sociais pensam há séculos no significado da política, que já foi
considerada a mais nobre das atividades humanas. Para entender a raiz dessa
atividade, tão desacreditada hoje, é preciso perceber que ela é muito mais que
o jogo político oficial. Renato Janine Ribeiro, filósofo e
pesquisador, resume em um trecho do livro Política Paru Não Ser Um Idiota: "Política
é o mundo feio, em que os políticos mandam. Não temos muito a ver com
eles." Pois é aí que está o engano.
UM PRIVILÉGIO
Um dos maiores pensadores gregos, o filósofo Aristóteles, declarou: "O homem
é por natureza um animal político". Ela estaria tão entranhada em nossas
vidas que seria (ou deveria ser) parte do que nos define como seres humanos.
Os gregos foram alguns dos mais fervorosos defensores dessa arte. Para eies, a
vida em comunidade era um valor admirável e participar das decisões da cidade
era visto como um privilégio dado pelos deuses.
Em Atenas, a política
estava aberta a todos que dispusessem de tempo para se dedicar aos debates e
votações. Era impossível pensar na vida sem política e ela se realizava na
vida cotidiana. Aristóteles foi ainda mais longe, e afirmou que a finalidade da
política é trazer a felicidade.
Claro, os tempos
mudaram. Nossas comunidades são muito maiores
que a Atenas daquela época, e até o conceito de felicidade mudou. Hoje milhões
de pessoas vivem sob um mesmo governo e seria impossível que cada cidadão
participasse da discussão de cada aspecto da administração de uma cidade,
estado e pais. Por isso, elegemos representantes, os políticos. Eles assumem o
papel de argumentar e de conduzir a confecção das leis.
DEMOCRACIA E FUTEBOL
E é
aí que a coisa emperra, pois nos sentimos desanimados com um sistema político
corrupto e que não representa os interesses dos cidadãos. Mas, por mais que
fiquemos indignados com o que fazem nossos representantes e tomemos a decisão
de não acompanhar mais as notícias, continuamos a viver e a respirar a política.
"Nesse sentido, nenhum de nós
escapa da ação,
reação e interação política, mesmo que não deseje", afirma Mário Sérgio
Cortella.
Não
foram poucas as vezes em que mudanças foram construídas pela própria sociedade
para só depois serem incorporadas às instituições. Para Luiz Felipe DÃvila,
diretor do Centro de Liderança Pública (CLP), o poder informal tem enormes
vantagens que, muitas vezes, as pessoas subestimam. Revoluções incríveis ocorreram
a partir de pessoas que não tinham nenhum cargo importante, por exemplo.
"Mahatma Gandhi conseguiu fazer o movimento de independência da índia
sem ter um cargo formal durante toda sua campanha de mobilização. Martin Luther
King conseguiu mobilizar todos os Estados Unidos em torno dos direitos civis
dos negros também sem ter uma posição oficial" diz ele. O poder de mobilizar
as pessoas em torno de propósitos claros e projetos é enorme.
Um exemplo curioso
e brasileiro aconteceu nos anos 1980.0 país vivia o fim da
ditadura militar, mas ainda sem perspectiva de fazer eleições presidenciais
diretas. Começava uma mobilização chamada Diretas Já, que envolveu muitas
pessoas dentro e fora da política
tradicional. Entre
elas, um time de futebol, o Corinthians. Para dar o exemplo, a direção
deu a liberdade de os jogadores tomarem as decisões do time por voto direto.
Tudo era colocado em debate e votação, "até se o ônibus ia parar para
alguém fazer xixi" contou o jogador Sócrales no livro batizado com o nome
do movimento; Democracia Corinthiana (editora Boitempo). Para Wladímir
Rodrigues dos Santos, 58, ex-lateral e um dos destaques da
"Democracia", aquilo "foi uma oportunidade de mostrar às
pessoas a importância de interferir na sua micror-região, microssociedade, uma
situação em que os atletas de futebol pensavam não só na sua situação pessoal,
mas no coletivo". O alcance da política atinge os mais distintos locais de
convivência humana, em qualquer área.
DESTINO CONJUNTO
O que fazer, então,
para não fugir da raia e cumprir a missão humana da convivência? Primeiro, é
preciso pensar que a política é algo dentro do nosso alcance. Lui/, Felipe
D'Ávila dá a pista do primeiro passo: "A política não é coisa de cientista
político, ela é coisa das pessoas. Coisa do povo", diz. "Não é gente
que fica pensando tese.
Se você
não transformar essa tese em ação, ela não existe. Política é ação. O animal
político do Aristóteles é isso." Não adianta só esperar acontecer, como
diz a música. Vale lembrar que não existe política individual; existe ação
individual na ação política. "Como diz o clássico poema do John Donne,
nenhum homem é uma ilha, portanto, a política é o fato de que nós em
arquipélago vivemos." Outras sugestões para atuar politicamente você
confere no quadro ao lado.
Na última
parte de Política para Não Ser um Idiota, Cortella e Renato Janine
Ribeiro discutem a necessidade da política em um mundo que luta contra a
destruição que a própria humanidade vem causando à natureza. Na penúltima
página, Ribeiro define o quanto ainda precisamos viver em comunidade e,
portanto, dar valor à política: "Nossa sociedade pode ser muito
individualista, mas nosso destino será jogado em conjunto". Melhor que
nos afastarmos definitivamente da política para não termos de lidar com
escândalos é retomarmossuãlT rédeas para de fato tentar melhorar as coisas.
Esse é um exercício que faremos juntos, em comunidade. ©
MANUAL DE POLÍTICA
3.0
Torne-se uma
pessoa muito mais atuante agora mesmo -sem precisar se envolver com partidos e
programas eleitorais
Atue na sua comunidade: preocupe-se com a associação de bairro, o centro académico, a segurança do condomínio, o destino do lixo do prédio.
Faça algo pelo coletivo. Não precisa ser uma ação de solidariedade: vale organizar um coral, um clube de leitura ou um jogo de futebol semanal.
Informe-se. Para agir, é preciso saberoqueacontece. Nossa tendência é nos alienarmos, portanto, é preciso um esforço para acompanhar os fatos
e saber analisar, de forma independente, o que ocorre.
Não fuja da raia. "Quem está em comunidade e decide não participar acaba se tornando escravo da alienação em que se coloca", diz Cortella.
O mais importante è participar.
Atenção para as novas ferramentas. Por meio de sites e e-mails, é fácil se conectar com pessoas com interesses afins. Participe de um fórum sobre um tema que o interessa ou inicie uma lista de discussão no seu prédio.
Fiscalize. Também por meio da internet, dá para acompanhar o que fazem os políticos em quem você votou. Sites como webcitizen.com.br e votenaweb. com.br permitem acompanhar o andamento de projetos, por exemplo.
PARA SABER MAIS
Política para Não Ser um Idiota, de Mário Sérgio Cortella e Renato Janine Ribeiro, Editora 7 Mares.
Democracia Corinthiana, de Sócrates e Ricardo Gozzi, Editora Boitempo
Política, de Aristóteles, Editora Martins
Fontes
A
política está no dia a dia, porque ela está na comunidade”, diz o filósofo Mári
Sergio Cortella
Conversar,
organizar eventos, encontrar uma causa em comum: a política é feita quando as
pessoas interagem.
Quando
deixamos de lado as diferenças e conseguimos nos organizar, ficamos mais fortes
e podemos fazer muito mais.
POR MAIS
INDIGNADOS QUE FIQUEMOS COM A CORRUPÇÃO E A FALTA DE
REPRESENTATIVIDADE, É IMPOSSÍVEL FUGIR DA POLÍTICA: ELA ESTÁ EM TODA PARTE
POLÍTICA
TEM A VER COM AÇÃO:
COMO DIZ A MÚSICA,
NÃO
ADIANTA ESPERAR ACONTECER. CADA UM É RESPONSÁVEL
POR IR ATRÁS
DE SOLUÇÕES
Fonte: texto de Diogo António Rodriguez publicado na revista
Vida Simples de Julho 2012.